Mães de Leiria - Elsa Brilhante

14.1.15
Família Brilhante, a mãe de sorriso fácil, gosta de viver intensamente a amizade e o amor, crente na vida e nas pessoas, tem nas mãos um dos maiores desafios da vida, fazer tudo o que tem ao seu alcance pela felicidade e futuro do João, sem nunca descurar toda a família.



Apresenta cada um de vocês e identifica algumas das características/personalidade.
Começo pelo João que é um menino de 4 anos de sorriso fácil e muitas vezes maroto também. O João adora miminho, adora livros, cada virar de página faz com que a sua respiração fique acelerada, um carrinho rapidamente lhe chama a atenção mas se a Kity que é a nossa gata se atravessa para saltar para cima do sofá acaba por ser a merecedora de toda a sua atenção. O João irradia uma luz muito própria, é um ser muito especial consegue realçar o melhor que cada um traz dentro de si.

O Gabriel é o irmão mais velho em que os 11 anos assentam na perfeição na sua ingenuidade, mas que ao mesmo tempo destoam pela maturidade que o João trouxe à sua vida. É um menino de bom coração, um pouco introvertido quando não se sente à vontade. Tem um lindo sorriso que condiz com o olhar meigo com que cuidadosamente troca a babete ao mano, sente-se realmente o ar de irmão mais velho e protetor quando um minuto basta para compreender a cumplicidade que os une. O Gabriel consegue perceber quando estou triste, apesar do meu sorriso rapidamente sou descoberta pelo seu sexto sentido.

O Carlos é um homem de princípios, um homem de valores que agora são muito raros ver por aí, talvez por isso faça dele o pai e o marido que eu amo tanto. O Carlos é muito protetor, tanto como pai como marido e é ele que muitas vezes me traz à terra quando a minha imaginação e a minha versão sonhadora me tentam levar a melhor. O Carlos dá-me a segurança e o amor que preciso para ser feliz, ama os nosso filhos e é muito consistente na forma como encara a educação.

Agora eu, eu nunca fui de desistir de nada. Confesso que adoro desafios, vivo com objetivos. Tenho necessidade de ter um dia cheio, não sei estar na vida de outra forma. Sou uma mulher de sorriso fácil e acho mesmo que o João tem a quem sair. Gosto de viver tudo de forma intensa quer amizade quer o amor. Arrisco muito. Adoro fazer rir as pessoas que me rodeiam, fico feliz se os meus amigos são felizes. Sou teimosa, persistente, sonhadora, crente em mim e nos outros (às vezes demais nos outros).Tenho o coração demasiado perto da boca. Sou uma mulher que adora receber mas vibra muito mais com o dar, sou por vezes demasiado transparente e não é preciso muito para alguém mais atento perceber o que afinal esconde o meu sorriso num dia menos bom.

Como é o vosso dia a dia/rotina diária
A euforia total…Presentemente estou de baixa para assistir o João. O Carlos é o primeiro a acordar e a sair de casa. Eu acordo ás 7.20 para acordar o Gabriel e orientar o pequeno almoço. O transporte do centro de estudos que o Gabriel frequenta passa na nossa porta as 7.50 para o levar para a escola e a partir daí fico descansada pois no final do dia é o mesmo transporte que o leva que o traz novamente para casa as 19.00, de outra forma não conseguia fazer face à rotina da fisioterapia do João. Depois do Gabriel sair tomo o meu banho enquanto o João ainda dorme, só depois o acordo e visto para ir para a escola. Depois de os miúdos estarem na escola é tempo de dar um jeito em casa, fazer camas, orientar jantar e roupas. Por volta das 14h00 lá vamos nós para mais uma sessão ou mais sessões de terapia na Kinesio em Espinho. Regressamos a casa por volta das 17.00 e é hora de responder às mensagens da pagina do João, colocar fotos das terapias e ler os comentários…e rapidamente chega a hora de fazer o jantar…entretanto chega o Gabriel e o Carlos 
Fazemos questão de estar juntos na sala antes de começar a sessão de banhos ....pijamas...lavar dentinhos…enfim o terminar de um dia sempre cheio.

És mãe de uma criança especial, como foi descobrir e enfrentar o diagnóstico do João?
O João nasceu de cesariana era para todos um bebé dito normal, no dia da alta apenas ficaram consultas marcadas para controlar o perímetro cefálico que era um pouco inferior ao normal mas o João era todo ele pequenino…Aos dois meses de idade numa das ecografias a médica desconfiou de algo e pediu que fizesse uma RM ao João. Nessa altura estremeci estava sozinha com o João, mas sem hesitar perguntei à medica se o João poderia ter uma deficiência, com o olhar e um sim tremido a médica respondeu à minha pergunta. A consulta ficou marcada para um mês depois para sabermos o resultado. No dia da consulta o Carlos foi comigo e foi nesta consulta que a médica nos disse que o João tinha uma polimicrogiria (uma malformação cerebral em que os neurónios não migraram para o sitio correto dando assim um atraso psic-motor). Ainda hoje não sei o que eu e o Carlos dissemos um ao outro a caminho do carro, foi como se o meu cérebro apagasse o maior momento de dor da minha vida. Sei que durante 6 meses vegetamos na vida, fizemos o nosso luto após procuras esgotantes de sinais de normalidade no desenvolvimento, nas posturas do João. O que mais nos trazia a realidade era o facto de não segurar a cabeça e não se sentar. Não é fácil aceitar uma realidade assim, achamos sempre que só acontece aos outros. Após o nosso tempo de recuperação a este balde de agua fria e porque cada pai tem o seu tempo, enfrentamos a nossa realidade atendendo às necessidades do João. Para traz fica uma notícia como esta dada no hospital sem direito a acompanhamento psicológico, um encaminhamento tímido para uma estimulação precoce para Inglês ver e uma revolta com um sistema de saúde que não atende a nenhuma das necessidades de uma criança com deficiência.


Com o objetivo de melhor a vida do João, pediste ajuda ao mundo. Foi uma decisão difícil? 
Após constatar que o estado daria ao João uma sessão de fisioterapia por semana, e tendo eu mergulhado em pesquisas e mais pesquisas na net devido à falta de definições e explicações sobre a doença do João sabia que tinha de agir, pois um menino como o João precisa de trabalhar diariamente para que as células que não estão afetadas façam o trabalho de assegurar a competência das que estão. Somos uma família com orçamento familiar baixo, nunca conseguiria fazer face a fisioterapia a nível privado sem ajudas. Apenas as pessoas mais próximas e família sabiam do caso do João. Sabia que tinha de gritar ao mundo um pedido de ajuda, meti o medo de me expor e uma vergonha estúpida no bolso e abri um grupo no facebook a expor o caso. Nessa altura ainda nem tinha aberto conta bancaria para o João e pensei que apenas amigos se juntassem ao grupo. Após uma hora já tinha 400 membros. Foi uma decisão difícil pois sabia que a partir daquele momento a minha vida seria um livro aberto para quem quiser ler, a privacidade deixou de existir pois se queres ajuda tens de te mostrar ,ser transparente para que as pessoas acreditem e apoiem a tua causa.

O grupo do facebook 'Vamos ajudar o João' tem sido uma grande fonte de divulgação e de ajuda, fala um pouco deste grupo.
Sim este grupo foi um iniciar de conquistas Já com nib exposto as ajudas começaram a surgir, e o João conseguia fazer 3 vezes de fisioterapia por semana com um terapeuta cubano que se deslocava ao infantário, pois eu ainda trabalhei durante os primeiros 3 anos. Depois surgiu a ideia de ir a Cuba e muitos eventos se fizeram. O maior de todos foi o São João Brilhante no Jardim junto ao antigo café ócio que era de uma grande amiga minha e que foi também a criadora da página Todos Juntos pelo João que se mostra ao mundo como um coração azul também da sua autoria. O grupo do João foi perdendo audiências face á página do João e atualmente Todos juntos pelo João é onde podes seguir tudo o que nos diz respeito. No fundo 10 mil membros não significam 10 mil ajudas, havia pessoas que eram adicionadas e nem faziam ideia do que se tratava. Assim a pagina ganha gostos apenas se alguém tiver interesse em seguir.




Como lida o Gabriel com a vossa luta para proporcionar uma futuro melhor ao João? 
O Gabriel sempre foi um menino muito sensível, e com a chegada do irmão que não era bem o que esperava foi obrigado a fazer o seu luto também. Antes sentia o Gabriel envergonhado quando as pessoas ficam especadas a olhar para o João, agora sinto o orgulho com que quer passear o João na sua cadeira, a despreocupação com quem olha ou deixa de olhar quando o João deixa cair mais a cabecinha ou quando se troca a babete. O Gabriel diz à boca cheia que gosta do João tal e qual como ele é. Sei que o Gabriel será sempre o seu melhor amigo e isso dá-me um conforto emocional e leveza na minha alma.


Quando pensas no Gabriel e no João qual é o maior desejo para eles?
Quero acima de tudo que sejam felizes como são agora, pois arrisco a dizer que o João apesar da sua condição é um menino muito mais feliz do que certas crianças ditas “normais”. Quero que saibam respeitar o próximo, saibam viver em paz. Quero que acordem sempre com um sorriso para a vida, quero que se inspirem nas dificuldades da vida e alterem o significado das mesmas para alegrias e conquistas. Quero que o verbo desistir não faça parte do vocabulário nem de um nem de outro. Quero que me lembrem com orgulho e como exemplo quando pensarem que algo não vale a pena. Quero que deem valor aos momentos, porque a vida é isso mesmo. E especialmente para o João desejo atingir o máximo de autonomia que a doença permitir. Se o João não puder falar que seja capaz de comunicar com um tablet, que consiga agarrar num copo para beber água, que se não puder andar que seja capaz de conduzir uma cadeira elétrica. Isto é um desejo de mãe quando o luto está realmente feito e apesar de lutarmos com todas as forças para vencer a doença, conseguimos aceitar a condição do João e apenas lhe queremos dar o melhor de uma vida.

Perdes a cabeça com... 
Falta de humildade, hipocrisia, falta de respeito e o lugar de estacionamento para deficientes ocupado por um carro sem dístico em que a pessoa que o conduz tem realmente a maior deficiência do mundo..a estupidez.

Amas quando... 
Sinto que as pessoas se sentem bem ao meu lado. ..Quando chega ao fim de semana e estamos os quatro juntos sem horários…tomamos o pequeno almoço juntos ao domingo…quando o João sorri e os olhinhos se derretem de mimo..quando o Gabriel diz que me ama muito e quando eu e o Carlos estamos por algum motivo a discutir um assunto e de repente nos desmanchamos a rir..

Ser mãe é...
Ser mãe é fazer tudo por um filho, poder olhar para trás e saber que nada mais podia ter sido feito para que neste caso a condição do João melhorasse...é apesar de não descurar da nossa imagem e de nós próprios a  prioridade na vida ser realmente o bem estar dos seres que colocámos no mundo.

(Tenho que agradecer à Catarina Paz por me ter apresentado a Família Brilhante e por me ter ajudado a escolher as perguntas certas a fazer. Esta é uma família com força, que nos faz pensar que alguns dos nossos problemas estão só mesmo em nós, que ser feliz depende da nossa vontade e força. Obrigada Catarina e Elsa!) 

Sem comentários:

Enviar um comentário