Mães de Leiria - Clara ten Broek

18.3.14

Hoje temos uma mãe de uma cidade bem diferente de Leiria. Amesterdão foi a cidade onde a vida levou a Clara a constituir a família. Alexander tem 6 anos, meio português meio holandês, amoroso e manda respostas com nível!! 


Apresenta cada um de vocês e identifica algumas das características/personalidade
Vamos lá então dar a conhecer a família “ten Broek”. A mãe, Clara, nacionalidade portuguesa, nascida em Leiria. Amiga, simpática, dada, dedicada, fiel, independente, teimosa, por vezes um bocadinho arrogante (ninguém é perfeito!), determinada, trabalhadora, ambiciosa e nos últimos meses... atlética. Extrovertido, mas só quando conheço bem as pessoas. Para finalizar, sincera e direta, o que por vezes é um bocadinho demais porque acabo por ser direta demais! Sorry   :-(

O pai, Patrick, nacionalidade holandesa, nascido em Amesterdão. Inteligente, liberal, amigo, responsável, sincero, extrovertido, ambicioso, calmo, optimista. De vez em quando teimoso e preguiçoso! Adora dormir à tarde. Está mais para “espanhol” que dorme “siesta” com muito prazer! Companheiro, amigo, marido. Deixa-me ser, não me trava ou tentar mudar. Compreende a minha necessidade de independência. Tenho muita sorte mesmo por o ter a meu lado.

Alexander, nacionalidade Holandês, nacionalidade não oficial: ½ Português & ½ Holandês, nascido em Lausanne, Suíça. Com 6 aninhos é um amor, simpático, bem comportado, amigo, amoroso, quase que tenho coragem de dizer que será um daqueles rapazinhos que todas as sogras gostariam de ter para as suas filhotas! Pronto, já disse! Mas, também tem os seus dias... e então é reguila, teimoso, firme na sua opinião e já sabe “mandar respostas de nível”! É extrovertido... fala pelos cotoveles quando conhece alguém! Eu até já podia escrever um livro só com as perguntas que faz todos os dias... Não havia qualquer coisa nesta entrevista de “desligar o botão de mãe”? Era mesmo nessas horas!
Como é o V/ dia a dia/ rotina diária?
Durante a semana, o dia-a-dia é...:

De manhã, o despertador biológico do Alexander toca as 7h certinhas! (só quando não é aquele inverno bem rigoroso...) O Patrick levanta-se, faz o pequeno almoço e tomam-o juntos. Eu como não sou de pequenos almoços e gosto bem do meu “me time” de manhã, levanto-me, tomo o meu banho, arranjo-me e saio (por voltas das 8h já estou no trabalho). O Patrick faz o lanche e o “almoço” do Alexander (na Holanda almoço é sandes, não se come quente) e leva-o à “pré-escola” (um lugar aonde só brincam e depois quando a campainha toca por volta das 08:45, levam-no para a sala de aula).

Quando as aulas terminam às 15:15, a equipe da “após escola” vai buscá-lo e levam-o para um espaço de tempos livres, aonde brincam, lêem livros, pintam, aprendem música, vão passear a uma quinta (kinderboerderij) bem pequenina, no centro de Amesterdão, vão ver as cávias, as galinhas, as cabras, os coelhos, etc. (dão de comida e água aos animais, fazem festinhas)

Por volta das 17h00 vou buscá-lo. Chegamos a casa, faço o jantar, esperamos pelo pai (se este chega a tempo, nem sempre infelizmente) e depois toca de jantar, tomar duche, lavar os dentes, ler uma história antes de dormir... e mais uma porque não aguenta não saber o que vai acontecer a seguir com o personagem... e depois “chichi e cama”! Não paro até lhe ter dado uma  beijoca e ter dito “boa noite, dorme bem”. Normalmente as 19h/19h30 está na cama... Agora que os dias são mais compridos (luminosos), vai para a cama mais tarde por volta das 20h, porque ele precisa mesmo do “sono de beleza” dele para andar sempre bem disposto.

Até parece que oiço as pessoas em Portugal espasmadas do quão cedo ele vai para a cama! Não?

Como é conciliar o trabalho com a maternidade?
Eu acho que todas as mães que respondem a esta pergunta dirão que é complicado! E é mesmo. Alexander primeiro, trabalho depois... mas também gosto do meu trabalho. Afinal não lutei tanto para estar aonde estou, para nada, não é? E acredito que o Alexander entende isso. Tento balançar bem entre o trabalho e a família.

Quando vens a Portugal onde costumas levar o Alexander? De que sítios é que ele gostou mais? E em Leiria (distrito), onde costumam passear?
A verdade é que quando estou em Portugal, parece que nem estou de férias! Alguma família está no centro, na zona de Leiria, mas o resto está no norte (S. João da Madeira e Aveiro) e então dividimos o tempo entre todas as localidades.

Na zona do norte, adoramos ir a Barra, a Aveiro (ver as salinas e comer bolacha com molho de chocolate... que delícia...). Vamos à Torreira, ao Furadouro, ao Porto (minha cidade favorita), Vila de Nova de Gaia (ver as caves do vinho do Porto), Braga, Bragança, Guimarães e também Coimbra é claro! E muitos mais sítios. Visitamos bastante, adoramos viajar os três. Normalmente de manhã visitamos cidades, almoçamos por lá e depois à tardinha, dirigimos-nos para a praia, para aproveitar o sol.

Na zona de Leiria, adoramos ir aos castelos, grutas, praias, mosteiros, etc... O Alexander gosta de tomar café no Terreiro em Leiria, junto com a mamã, porque mandamos vir sempre um pastel de nata (para cada um! Somos os dois gulosos e fãs de pastel de nata! Pequenas delícias que não temos por aqui, infelizmente.). Adorou ir ao Aquaparque na Vieira de Leiria, ficava por lá se o deixasse. Adora ir ao castelo de Leiria e pular, saltar, subir escadas, descer escadas, tropeçar e olhar Leiria bem pequenina, bem lá do topo. Adora todas as praias (Nazaré, Vieira de Leiria) mas a preferida é sem dúvida a de São Martinho do Porto, porque será?!? “Parece uma piscina mamã...”.

O Mosteiro da Batalha e o Mosteiro de Alcobaça acha interessante, adora as grutas e acha tudo lindo e brilhante mas um bocado frio e não percebe porque pagamos à entrada e depois atiramos outra vez dinheiro para as lagoas na gruta.

Adora estar na casa do meu pai, perdem-se os dois no quintal. Acha que o quintal do “avô Quim” é o quintal mais bem organizado, lindo, limpinho e aonde há galinhas, sardaniscas, joaninhas, formigas... “Parece um zoo de animais pequeninos, mamã”!. Fica todo em pulgas quando pode dar água às árvores e aos legumes. Sujar-se todo! É uma festa! E o meu pai, é claro, consola-se de ter o neto tão interessado nessas coisas de agricultura. E lá vai ensinando o Alexander como as couves crescem, que tipo de couves são, como apanhar milho. E como não basta, leva o Alexander a passear pelos pinhais a apanhar paus, tacos, pinhocas... sei lá!!
Em Portugal, parece uma criança livre, despreocupada, sem medo e fica com uma energia, que não há ninguém que o ponha na cama antes das 22h!

E eu fico toda orgulhosa, porque afinal, mesmo não nascido em Portugal, considero o meu filhote metade português. E adoro que ele veja como a mamã brincava antes, aonde a mamã estudava (adorou o IEJ, a reação foi: “tãooooooooo grande!!!!!!!!!!!!”). É uma delícia ver o meu filhote passear e não ter de se preocupar constantemente se há um carro, uma mota, uma bicicleta, tram, que lhe passará a frente! Só se ouvem pássaros e sons bem longes e calmos. Não há stress.

Já agora, fica aqui o restaurante favorito dele: “O Santos” na Nazaré, aonde ele adora comer mexilhão com molho de cebola e tomate. Come três pratos se o deixo! Nunca vi garoto assim para comer peixe! Seja mexilhão, bacalhau, dourada, sardinhas... Adora!

Em casa falam em que língua? Fazes questão que o Alexander fale português? Achas importante para ele, porquê?
Quem não quiser ler um testamento... salte para a pergunta a seguir! Ficou avisado/a!

Em casa falamos holandês. E muitos perguntarão, porquê? Pois... a resposta... mais fácil falar que fazer! Para perceberem o porquê, teria que contar a história toda, desde o princípio, e acho que é longa e dolorosa demais para escrever aqui. Fica aqui então a versão mais curta.

Ainda estão a tempo de saltar para a pergunta/resposta seguinte!!! :-)

O Alexander nasceu na Suíça, aonde aprendeu muito bem o francês. Na altura em que começou a falar mesmo, a dizer algumas palavras e frases, era tudo em francês já que estava na escola a tempo inteiro e a língua dele do dia-a-dia era a francesa. Pouquíssimas palavras em português ou holandês apareciam nessa altura. E quando apareciam, era tudo misturado. “Falava” português com o pai, que lhe respondia em holandês e vice versa comigo.

O certo é que, quando ele começou a falar bem, era em francês que falava, já que essa era a língua que ele mais praticava, ouvia, etc. Nessa altura, devido a novas oportunidades de trabalho, mudámos-nos outra vez para a Holanda. O Alexander foi para a creche holandesa (infantário) e o vocabulário dele, que nessa altura se começava a desenvolver, era mínimo na língua holandesa e portuguesa. O Alexander era muito pequenino para se aperceber que de repente se encontrava num outro país e que teria de deixar o francês completamente.

Tudo isto resultou em muitas sessões de terapia da fala para desenvolver os sons holandeses, que acreditem, são bem diferentes dos sons da língua francesa. Ao mesmo tempo que o Alexander tinha a terapia da fala, entrou para a escola primária aonde o vocabulário holandês se começou a desenvolver (o vocabulário francês desaparecia ao mesmo tempo). Com tanta mudança veio a decisão dos “experts” de não introduzir mais uma língua em casa. Já estão a imaginar, nada de português!

De acordo com os peritos (que falaram connosco), para uma criança falar várias línguas corretamente, ela precisa de falar pelo menos corretamente uma delas, o que nunca é o caso em situações de crianças educadas com mais de uma língua. Normalmente a criança terá o mesmo vocabulário, tanto numa língua como na outra mas em comparação a outras crianças que têm só uma língua, o conhecimento do vocabulário geral é menor. Tipo, uma criança bilíngue terá um conhecimento geral de 60% do vocabulário em comparação com outra criança não bilíngue, mas saberá esses 60% do vocabulário em duas línguas (ou mais).

Para haver sucesso em aprender uma língua correctamente, de acordo com os peritos, não se podem introduzir outras línguas ao mesmo tempo durante esse período. A decisão cá em casa foi então de não falar nem francês (é claro!) e não falar português, até o Alexander ter o mesmo nível de holandês que uma outra criança na sua idade tem. O que uma criança aprende de holandês em três anos, o Alexander teve de aprender em alguns meses. Mas agora já estamos quase no mesmo nível. Só mais um bocadinho, só mais uns mesinhos.

É claro, que nem tudo são mar de rosas e nem sempre consigo explicar tudo em holandês, também não tenho um dicionário holandês enfiado na cabeça, não é? E às vezes com a pressa... lá sai umas palavras por aqui e por ali em português.

Por isso e agora respondendo diretamente às questões acima:

Falamos holandês e por vezes lá me sai umas aqui e ali em português. Especialmente se estou zangada! Não consigo estar zangada e “ralhar” em holandês. Por isso, palavras como “castigo”, “chatear” e a célebre contagem crescente “1, 2, 3!” (senão de castigo no quarto!) é tudo em português! É claro que sabe mais coisas, tipo contar até 15, “bom dia”, “boa noite”, “olá, tudo bem?”, “comando da televisão”, “frigorífico” (e diz bem esta!), “sumo de maçã”, “copo”, “mesa”, “janela”, “sim”, “não”, “não gosto”, “mais”, etc... muitas mais. O problema é q não consegue ter uma conversa e fazer frases longas. Só sabe as palavras assim à solta.

Se faço questão? Se acho que é importante? É claro que sim... tem de aprender português, agora ou mais tarde tanto me faz. Mas tem! Acho que faz parte da minha cultura e por isso da dele. E é tão bom quando ele consegue falar com a família em Portugal. Ele sempre se desenrasca e acaba por aprender algum português enquanto de férias mas depois como não se utiliza por estes lados... esquece tudo. Mas daqui a uns meses, quando o holandês dele estiver a 100%, uma explicadora trata do português, não tenho medo.
Uma das desvantagens dele, mesmo querendo aprender, é o fato de que eu mesma falo muito pouco português no dia-a-dia e o que vou falando tem “tanto pontapé na gramática portuguesa”! Ou também porque como falo pouco, começo a esquecer-me das palavras... vergonha!!

Ainda bem disse que esta história era a versão curta! Imagina se tinha escrito a longa?!?!  :-)

Tens momentos em que te apetece desligar o “botão mãe”? O que fazes?
Ui, ui... tenho sim. É claro! Quem não tem, mente!
Correr no parque ajuda muito (boa música no Ipod e totalmente desligada do mundo durante kms ajuda imenso). Mas ir jantar fora, fazer compras (shopping) sozinha, 1h de massagem, cabeleireiro, sair com amigos e beber uns cocktails, etc... são atividades que ajudam bastante. Desde que o Alexander nasceu que tenho sempre tempinho para mim. Nem sempre foi mar de rosas mas tento bem “desligar” por alguns momentos para não esquecer quem eu sou! É necessário, se não dou em doida. Durante o mês a minha manoca toma conta do puto, ou o meu cunhado, ou sogros ou mesmo o Patrick enquanto eu vou aproveitar o meu “me time”.

Consegues falar sobre a diferença em ser mãe em Leiria e mãe em Amesterdão?
Não sei o que é ser mãe em Leiria. Quando estou aí, estou de férias e as minhas regras e proibições também! Mas ser mãe em Amesterdão, é ser mãe como em qualquer lado. Correr de casa para a escola, da escola para o trabalho, do trabalho para casa... Descansar nos fins-de-semana.


Agora, ser mãe em Amesterdão com pouca família torna as coisas mais difíceis. A ajuda que alguns pais têm aqui com os filhos, eu pouco tenho. Só mesmo da parte dos meus sogros que de vez em quando ajudam, ou por parte da minha irmã e do meu cunhado. Mas, também não é a mesma ajuda que teria se tivesse educado o meu filhote em Leiria. As pessoas que me ajudam aqui também trabalham, tem os seus próprios compromissos e a sua própria vida bem ocupada. Amesterdão é uma cidade de correria, cidade cosmopolitana, de muitas saídas durante a semana, de muitos jantares, “social life”, etc. Cidade de mais de um milhão de pessoas... Não é uma vida pacata, o que não ajuda quando se quer educar uma criança e quando se tem de pedir ajuda a outros.

Uma outra dificuldade: as escolas. Quando a criança tem dois anos, já temos que inscrevê-la na escola que nós pais gostaríamos que a criança frequentasse (escola dos 4 aos 12 anos). Esta inscrição, não garante lugar na escola. Normalmente as escolas têm listas de espera de mais de 3 anos e quando há lugares disponíveis, as crianças são sorteadas, tipo totoloto!! E como se não bastasse a lista de espera para as escolas, também há depois a lista de espera para as escolas de tempos livres que se deverão situar perto da escola que a criança frequentará. Porque a escola terá que apanhar a criança à escola todos os dias. O que “obriga” algumas pessoas a terem babysitters para estarem mais livres na escolha da escola. O conceito de ter Amas em Amesterdão é menos conhecido. Normalmente há babysitters ou uma au-pair. Os custos são enormes para qualquer opção escolhida, tanto seja escola de tempos livres ou babysitter ou Ama ou a au-pair. Aliás, au-pair  ainda é mais complicado, porque apesar de ser a opção mais barata, tem muitos “senãos”. A aupair tem de dormir na mesma casa (e não paga renda), tem de ter quarto próprio, trabalha um certo número de horas por semana e normalmente não fala a língua que os garotos falam. Uma au-pair normalmente fica por um ano. O que indica que todos os anos os pais tem de se habituar a uma desconhecida, que tomará conta da criança mas mais não sabemos.

Estes são só alguns exemplos de educar/criar um filho em Amesterdão, mas há muitos mais. Não é fácil, mas nós adaptamos-nos a este estilo de vida. E os nossos filhotes também. Eles não conhecem outro estilo de vida.


Perdes a cabeça com…Os disparates que ele faz, porque viu um outro amigo fazer. Dou em doida! Esforço-me tanto para o educar e em 5min, está tudo perdido!


Amas quando….Fazemos asneiras juntos, rimos à gargalhada por coisas mesmo estúpidas. Quando o Alexander me diz que me ama daqui até a lua e de volta e depois se retifica... e diz, até à lua não, até ao espaço que é mais longe! Derreto!


Ser Mãe éfalar com razão, sofrer com o coração e às vezes deixar o pequenito aprender com os próprios erros. Tem de ser! Não estarei cá para sempre e algumas decisões tem de ser ele mesmo a fazer, e também a sofrer as consequências. Se vai subir na árvore... há chance de cair no chão e magoar!!

Amigas há muito, mas distantes pelas diferentes escolhas, adoro a net que nos aproxima :) Obrigada Clara!! 


6 comentários:

  1. Adorei a tua entrevista Clara. Deixaste-me arrepiada. Continuas forte e corajosa como sempre te conheci. PARABÉNS!

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  2. Adorei a tua entrevista Clara. Deixaste-me arrepiada. Continuas forte e corajosa como sempre te conheci. PARABÉNS!

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    1. Oi! Obrigada... gostei imenso de participar, longe mas um bocadinho perto... :-)
      Bjs Clara

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  3. Foi um prazer ler-te, Clara!
    A personalidade continua vincada!
    Tudo de bom! :)
    E à Ana, parabéns pela pertinência das questões!!

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    1. Estou a ficar com medo!
      As pessoas deviam/devem ter uma imagem terrivel de mim... Eu sou boa pessoa! A serio! :-)
      Obrigada, Clara

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